Arte de Fabio Leon sobre foto de Pablo Vergara (Brasil de Fato/RJ) 

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15 de junho de 2020

Artigo

Políticas públicas para mulheres negras da Baixada Fluminense 

Se a Baixada Fluminense, região que reúne 13 municípios e quase quatro milhões de habitantes, tem um número expressivo de negros e pobres, por que há pouca ou nenhuma política pública para as mulheres negras?

 

Por Cíntia Cruz, jornalista

 

 

Faltam políticas públicas para mulheres negras na Baixada Fluminense. Quem ler essa frase pode se perguntar: E por que não para brancas? "Somos todas mulheres", questionariam. Basta uma rápida pesquisa na internet com o termo "mulheres negras" para que os dados mostrem o abismo que as separam de homens brancos e mulheres brancas.

 

O racismo e o machismo são mazelas históricas da sociedade brasileira. E mulheres negras sofrem o que Lélia Gonzalez chama de tríplice discriminação: raça, classe e sexo. Nas pesquisas recentes, elas ocupam os piores índices socioeconômicos. Segundo dados do Instituto Igarapé, no Estado do Rio de Janeiro, entre 2016 e 2018, mulheres negras sofreram a maioria dos casos de feminicídio: 64% do total. Elas também sofreram, de 2015 a 2018, 51% do total de casos de violência contra mulher.

 

Em reportagem recente do site G1, a economista e professora da Unicamp, Marilane Teixeira, disse, com base na última Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD Contínua), do IBGE, que as mulheres negras correspondiam a 74% das mulheres sem carteira assinada, e de como elas seriam afetadas pelo isolamento social durante a pandemia da Covid-19. Também do IBGE, a pesquisa Desigualdades Sociais por Cor ou Raça, divulgada ano passado, mostrou que mulheres negras recebem menos da metade dos salários dos homens brancos.
 

Além dos últimos estudos, há o debate em torno da solidão da mulher negra, de como ela é excluída, desde a infância, quando, por exemplo, é alvo de apelidos carregados de racismo, até a fase adulta, quando rejeitada pelos companheiros, abandonada com os filhos, vítima de violência doméstica. Em “A mulher negra na sociedade brasileira”, Lélia fala de como as jovens negras que exercem a profissão de mulata "são manipuladas, não só como objetivos sexuais, mas como provas concretas da 'democracia racial' brasileira", e que elas não percebem "que constituem uma nova interpretação do ditado racista: 'preta pra cozinhar, mulata pra fornicar e branca pra casar'".
 

Se a Baixada Fluminense, região que reúne 13 municípios e quase quatro milhões de habitantes, tem um número expressivo de negros e pobres, por que há pouca ou nenhuma política pública para as mulheres negras? Há pesquisas feitas diretamente com elas? Os gestores sabem quais são suas principais necessidades? Onde estão esses dados? Há pesquisas feitas com mulheres negras e lésbicas? As pastas voltadas para mulheres não contemplam a especificidade da mulher negra. As ações que vemos partem, na maioria das vezes, de movimentos sociais.
 

Faltam a essas mulheres programas de renda, atendimento psicológico, social, de saúde — 55,8% das mulheres negras brasileiras estão acima do peso, 27,4% têm hipertensão (brancas têm 26,2%) e 9,3% têm diabetes (brancas têm 7,7%), segundo a pesquisa Vigitel População Negra, do Ministério da Saúde. Olhar e criar políticas públicas para as mulheres negras não é negligenciar mulheres brancas, tampouco gerar uma separação. É, sim, retirar esse segmento das últimas posições de rankings sociais.