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18 de dezembro 

As múltiplas faces em se tentar acessar à Justiça

Centro de Direitos Humanos de Nova Iguaçu, em parceria com Fórum Grita Baixada, realiza roda de conversa para debater as variadas formas de dificuldade para quem precisa garantir seus direitos fundamentais. 

 

Realizada na última sexta-feira (15/12) na Paróquia Santo Antônio de Jacutinga, no centro de Nova Iguaçu, a roda de conversa “Acesso à Justiça e Direitos Humanos: desafios e perspectivas”, organizada pelo Centro de Direitos Humanos de Nova Iguaçu (CDNHI), em parceria com o Fórum Grita Baixada, reuniu especialistas da área do Direito, como o advogado Guilherme Monteiro, do CDHNI e do defensor público Daniel Lozoya, além de interessados em discutir temas como a elitização do Judiciário, a falta de informação sobre procedimentos jurídicos básicos que afetam diretamente as populações periféricas e as possíveis soluções a serem apresentadas nesse campo, incluindo uma breve análise de conjuntura.

 

A roda começou com a fala de Guilherme Monteiro, advogado do CDHNI, que forneceu um panorama sobre os atendimentos feitos pelo Centro de Direitos Humanos. Ele disse que há uma sensação de morosidade por parte do Estado, o que, segundo o advogado, reforça a sensação de impunidade. “O CDHNI costuma trabalhar, por exemplo, com ações relacionadas à saúde pública. Temos o caso de uma senhora que sequer tinha fraldas geriátricas para garantir a sua dignidade durante internação em um hospital estadual. Foi uma batalha para conseguir a transferência pra outra unidade de saúde e ao mesmo tempo tirá-la daquela situação de vulnerabilidade. Ou seja, Estado não cumpre seu papel. Eu cheguei a ler as peças processuais de um procurador do Estado que dava a entender que conseguir a fralda geriátrica naquele contexto seria o mesmo que atender a um capricho. Precisamos de uma discussão sobre a humanização do judiciário”, disse Monteiro, que ainda relatou o quanto a morosidade da justiça produz situações que desafiam a lógica. Segundo o advogado, há juízes, especialmente nos chamados tribunais especiais, que reclamam que o andamento dos processos realizados por  advogados recém-contratados via concurso público costumam ser “rápidos demais”.

 

Já a coordenadora do CDHNI, Yolanda Florentino, apesar de tecer elogios às varas da família, consideradas por ela como eficientes na rapidez com que conduzem os processos, fez críticas sobre a elitização e até o descaso com que o Judiciário se comporta na resolução de alguns litígios. “A maioria dos profissionais da justiça são de classe média alta, faltando-lhes sensibilidade na resolução de alguns temas. Quando vemos que os presídios estão lotados com pessoas pretas, pobres e faveladas vemos como nesses casos a Justiça funciona direitinho, como ela prevalece determinados setores. Vivemos uma época em que as vítimas precisam fazer o trabalho da justiça, principalmente quando há violações de direitos. Chegamos ao ponto em que as pessoas precisam qualificar a denúncia ou seja, produzir as provas, quando deveria ser o Estado a promover essas investigações. Dessa forma, não há ânimo para denunciar. É uma dificuldade que as áreas de periferias”, afirma Yolanda.  

 

Seguindo esse raciocínio, o coordenador executivo do Fórum Grita Baixada, Adriano de Araujo, em seu momento de fala, disse que essas anormalidades são reflexos de como a sociedade, tendenciando um perfil mais conservador em relação ao acesso à justiça, especialmente dos mais pobres, não elabora esforços para que esse cenário mude. “Com isso, temos o medo enquanto efeito para desmobilizar a população. Obter determinadas informações para dar início a qualquer processo não é um processo simples. Além disso, temos de lidar com a distorção crescente de que os Direitos Humanos, associados a iniciativas da justiça, é um direito para proteger bandidos apenas. Temos escutado alguns depoimentos, principalmente por mães que são atendidas tanto pelo FÓRUM GRITA BAIXADA quanto pelo Centro de Direitos Humanos, que seus vizinhos a criticam por buscarem algum tipo de reparação, pois automaticamente surge a interpretação de que elas ou seus filhos serem atendidos por algum órgão de Direitos Humanos, ambos já estarão associados a bandidagem em suas comunidades”. – disse Araujo.  

 

O defensor público Daniel Lozoya, um dos convidados da roda de conversa, forneceu um breve panorama geral sobre o judiciário brasileiro bem como o cenário político. Afirmou que a série de retrocessos que envolvem a perda de direitos fundamentais em diversos setores como o trabalhista e o previdenciário, fazem parte não apenas de uma crise fiscal ou política, mas uma crise da própria democracia. “A gente não se sente representado pelas pessoas e partidos que estão no poder. A democracia não é colocar um cheque em branco nas mãos dos governantes, mas é preciso uma prestação de contas para termos a dimensão sobre a forma como somos governados. A sociedade brasileira foi construída a partir de desigualdades sociais, violências, processos antidemocráticos, o que só reforça o estado de coisas que encontramos atualmente.”- afirmou Lozoya.  

 

O defensor também comentou o episódio envolvendo o comandante do 15º BPM de Duque de Caxias, Tenente Coronel Sérgio Porto que comemorou, em um grupo de whatsapp, o aumento do número de homicídios na região decorrentes de autos de resistência “Nós vimos aquilo como uma ameaça em potencial para toda a população de Caxias. Instauramos um inquérito a ser encaminhado ao  GAESP para que ele seja afastado de suas funções. Nosso papel é cobrar as instituições. A polícia tem muito poderes, mas ela precisa ter responsabilidades”, concluiu Lozoya.  

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O advogado do Centro de Direitos Humanos de Nova Iguaçu (CDHNI), Guilherme Monteiro (de vermelho) começa a roda de conversa. 

 

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A roda de conversa contou com a participação do defensor público Daniel Lozoya (de branco). 

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