10 de outubro 

Mortes em Queimados e Belford Roxo

Em mais uma semana violenta, seis pessoas são mortas. Cobrar rigor nas investigações é preciso.

 

Desde que foi criado, há cinco anos, o Fórum Grita Baixada salientou que as temáticas sobre Violência, Direitos Humanos e Segurança Pública seriam os elementos norteadores do projeto, no sentido de se incorporar soluções para essas questões, sob o ponto de vista da cidadania. Na última semana, pela rapidez com que os fatos se sucederam, essa premissa teve o seu significado reforçado: o assassinato de duas pessoas que, por uma triste coincidência, tinham ligações de parentesco ou de amizade com colaboradores ou apoiadores do Fórum Grita Baixada, em função da abrangência que o Projeto tem  em parte dos territórios da região.

 

Para além da tristeza e do medo que essas tragédias tenham causado em seus familiares e nos círculos de amizade nas comunidades onde habitavam, é necessário que as autoridades policiais e o poder judiciário conduzam de forma rigorosa essas investigações. O Fórum Grita Baixada irá acompanhar, no mesmo grau de importância dada a tantas outras tragédias que se abatem na região e dentro do que se espera de um projeto social dentro de uma sociedade democrática, a investigação das autoridades nessas situações. De forma que seja possível exercer o desejo de que responsáveis sejam identificados e a justiça prevaleça. A Baixada Fluminense não pode conviver com essa política de extermínio.

 

O primeiro caso é uma ironia cruel. Uma das colaboradoras do Fórum Grita Baixada, que realiza diversos trabalhos de conscientização sobre a violência, faz parte dessa lamentável estatística. Ela teve o sobrinho assassinado no último dia 02 de outubro. Rodrigo Martins era negro, de vida simples e morava no Centro de Queimados. Três jovens armados entraram no quintal da casa de Rodrigo e efetuaram os tiros. Rodrigo morreu no local e Gabriel que encontra-se internado em estado grave.

 

O segundo caso aconteceu na tarde do último domingo (08/10). Homens em um carro dispararam tiros em clientes do Bar Ramon, localizado na Praça dos Eucaliptos, no Centro da cidade de Queimados. Um dos mortos foi Edésio Virgílio da Cruz do Prado, conhecido como Deco, morador da Vila Nascente, que veio a óbito no local. Deco era irmão do ex-Secretário de Saúde Francisco Virgílio, recém-falecido, e tinha perdido um filho no mesmo dia da morte do irmão, há menos de dois meses. Deco era amigo de infância de um dos moradores da região que tem participado ativamente da organização de um Seminário Sobre Segurança Púbica sob a perspectiva da superação da violência promovido pelo FGB e que acontecerá no final do mês.

 

Quatro mortes em Bela Vista - Nova Aurora em Belford Roxo

Já na noite de sexta-feira, dia 06 de outubro, quatro homens foram executados a tiros, no bairro Bela Vista, próximo a Nova Aurora, em Belford Roxo. De acordo com o site de notícias Belford Roxo News, as vítimas são conhecidas como Felipe, Jean, Soro e Alcino moto-táxi. Ainda não há informações oficiais sobre a motivação dos crimes, porém populares informaram sobre uma invasão de bandidos na região. A Divisão de Homicídios da Baixada Fluminense (DHBF) investiga o caso.

 

Mais homicídios que a Síria

A preocupação em acompanhar os casos se deve em função de uma pesquisa publicada pela Estratégia Nacional de Justiça e Segurança Pública (Enasp), formada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) e pelo Ministério da Justiça. No documento, apurou-se que nos últimos 5 anos, 96% do número de inquéritos de homicídios apurados no Rio de Janeiro foram arquivados e os autores de crimes ficaram sem qualquer punição.

 

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“Não é só uma questão da polícia ter mais ou menos recursos pra esclarecer homicídios. Em Estados que claramente têm menos recursos que o Rio de Janeiro, a quantidade de denúncias foi maior. Temos que levar em conta que partiu-se de um estoque inicial muito alto, que já refletia um descaso com a investigação desse tipo de crime”, avaliou a socióloga Julita Lemgruber, do Centro de Estudos em Segurança e Cidadania (CESeC), da Universidade Cândido Mendes, em entrevista ao portal Globo News. “Temos que pensar qual é a importância do crime de homicídio no Brasil. Há um descaso histórico em relação a esse crime. Porque as vítimas em geral são negros, pobres, e moram ou nas favelas dos grandes centros urbanos ou nas periferias das cidades. São essas as vítimas dessa tragédia que é o alto índice de homicídios no Brasil. O Brasil teve nos últimos 4 anos mais homicídios que a Síria, um país em guerra, com bombardeios russos. Mas o Brasil consegue ter um número maior de mortes violentas”.

 

Baixada Fluminense: triste recordista nos crimes contra a vida

 

Apesar de questionamentos relativos à cobertura e as escolhas metodológicas sobre os números divulgados por órgãos oficiais no campo da segurança pública, é inegável que os dados do ISP ainda se constituem em uma das principais referências de fácil acesso a todo cidadão sobre a violência no Estado.

 

Dados do referido Instituto relativos a 2016 evidenciam que a violência letal (crimes contra a vida) na Baixada Fluminense ainda vigora como a maior do Estado, mesma posição em 2015. Se na capital em 2016 foram 1909 casos (30,49% do total do Estado) na Baixada esse número foi de 2100 (33,53%). Ou seja, mais de um terço de todos os crimes contra a vida cometidos no Estado do Rio é originário nas Baixada Fluminense. O interior aparece em terceiro lugar com 1575 (25,16%) e a Grande Niterói com números bem menores, especificamente 678 (10,82%).

 

Homicídios e tráfico de drogas: o mercado vale mais que a vida?

 

Ao observarmos somente os dados da Baixada Fluminense veremos que dos 2.100 casos de crimes contra a vida (letalidade violenta) 1.791 casos referem-se aos homicídios dolosos (85,28% dos casos de crimes contra a vida na Baixada Fluminense), 210 são decorrentes de oposição a intervenção policial (10% do total da Baixada), 89 relacionam-se ao latrocínio (roubo seguido de morte: 4,24%) e 10 casos (0,48%) referem-se à lesão corporal seguida de morte.

 

Apesar dos homicídios apresentarem valores altíssimos, a maior parte da composição da população carcerária não se deve a esses crimes e sim ao tráfico de drogas. Isto ocorre, segundo alguns pesquisadores, devido a baixa taxa de investigações e perícias e consequentemente de responsabilização dos responsáveis nos casos de homicídios. Para outros tal contingente decorre da política de repressão às drogas, que por um lado, não vem conseguindo diminuir os crimes associados ao tráfico e nem mesmo a presença das próprias drogas e de seu comércio, nem no atacado e nem no varejo. Há também os que associam essa seletividade nas prisões ao racismo institucional dado o fato de que essa população carcerária é majoritariamente negra; devemos salientar que nas prisões não encontramos os donos do grande comércio no atacado de drogas: grupos de poder econômico e político associados muitas vezes também ao tráfico de armas. Em outras palavras, matar uma pessoa no Brasil dificilmente leva alguém a ser responsabilizado por isso. Com isso, a perspectiva de redução desses homicídios, especialmente em periferias como a Baixada Fluminense parece estar longe do fim.

 

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