19 de fevereiro

Intervenção Federal como farsa político-partidária 

O Fórum Grita Baixada manifesta-se terminantemente contrário ao decreto 9.288/2018, que formaliza a intervenção federal-militar no Estado do Rio de Janeiro.

 

Entendemos que as motivações reais dessa intervenção em nada se relacionam com a efetiva redução da violência, muito pelo contrário, podem gerar mais violações e mortes, dada a lógica de guerra usada contra pobres e negros nas favelas e periferias.

 

Tanto o sofrimento quanto o medo do povo estão sendo usados pelo Governo golpista de Temer, novamente com o apoio da grande mídia para alcançar um duplo objetivo:

 

(1) desviar o foco sobre a reforma da previdência, cada vez mais combatida e rejeitada pela população, acompanhando a impopularidade do presidente;

 

(2) agradar a bancada da bala (a maior bancada do Congresso, com 299 parlamentares, superior inclusive à bancada da “Bíblia” e do “Boi”) e com isso tentar somar mais votos de parlamentares para a aprovação da reforma da previdência. Como já dito em entrevista recente[1], Temer pode suspender a intervenção federal no Rio por um dia a fim de permitir a aprovação da reforma, isso porquê, durante a intervenção, a Constituição Federal não pode ser alterada e a reforma da Previdência em andamento na Câmara é uma proposta de emenda à Constituição (PEC)[2].

 

Se isso tudo já não fosse suficiente, lembramos que a intervenção federal, reproduz e alimenta mais uma vez a lógica cruel e odiosa para com os moradores das favelas e demais regiões periféricas. Aliás, isso é basicamente o que o Estado brasileiro tem oferecido a esses territórios. A conversa é sempre a mesma e agora não está sendo diferente.

 

Por meio da lógica da guerra, há décadas usada pelas polícias do Rio de Janeiro, as favelas e periferias são retratadas como lugares perigosos e violentos que, portanto, devem ser combatidas sob a utilização de táticas bélicas: cercos às favelas; uso de blindados terrestres e aéreos; invasões à casas, conflitos armados em meio aos moradores ou mesmo na entrada ou saída das crianças das Escolas, além de ocupação de casas dos moradores para montagem de pontos de observação, entre outros mecanismos que visam o aprisionamento ou a morte dos inimigos e bodes expiatórios desse processo (os moradores pobres e negros das favelas e periferias).

 

Assim, a lógica da guerra só tem gerado mais mortes, medos e doenças; em nada tem reduzido a violência e muito menos faz a economia do comércio das drogas desacelerar.

 

Lembramos que se o governo federal realmente quisesse contribuir para a diminuição da violência, outras alternativas deveriam ser pensadas, e não aquelas que só vem prejudicando a população mais pobre.

 

O Governo federal poderia, por exemplo, promover um honesto e aberto debate sobre a política de drogas, desmilitarização das polícias, instaurar no âmbito federal e induzir no âmbito estadual políticas públicas para a juventude negra e pobre das periferias, como também para o desencarceramento e o controle de armas, repensando inclusive a lógica deste Estado punitivista.

 

Salientamos ainda que as próprias forças armadas têm se mostrado contrárias ao uso indiscriminado de seu contingente[3]. Nos últimos dez anos, 12 Garantias da Lei e da Ordem (GLO) com o uso das forças armadas já foram usadas no Rio. Alguém percebeu alguma redução na violência? Houve alguma prestação de contas sobre a eficácia de tais ações? É preciso que não nos esqueçamos que as forças armadas já são as responsáveis por monitorar as fronteiras do país por onde, por exemplo, entram as drogas, armas e munições que alimentam esse contexto de violência[4].

 

Portanto, é totalmente injustificada a intervenção militar no Rio de Janeiro. Ela não irá resolver os problemas da segurança pública e ainda será usada como cortina de fumaça para atender interesses eleitoreiros enquanto os problemas reais mais uma vez serão ignorados.

 

[1] https://g1.globo.com/politica/noticia/temer-diz-que-vai-cessar-a-intervencao-no-rj-durante-votacao-da-reforma-da-previdencia.ghtml

[2] A reforma só será aprovada na Câmara se tiver o apoio de ao menos 308 deputados em dois turnos de votação.

[3] http://m.agenciabrasil.ebc.com.br/politica/noticia/2017-06/comandante-do-exercito-diz-que-uso-de-militares-em-seguranca-e-perigoso

[4] https://oglobo.globo.com/brasil/apenas-4-das-fronteiras-do-brasil-sao-monitoradas-20839665